Um espaço desencarnado*
As últimas semanas confundem-se numa amálgama de milhões de pixéis, centenas de quilómetros e dezenas de cartas, zines, envelopes, postais, selos e carimbos, tanto virtuais quanto, maravilhosamente, palpáveis na caixa de correio que, entretanto, passei a abrir, cerimoniosamente, assim que passa o carteiro. Tornou-se ritual precioso, fotografar o envelope de ambos os lados, abri-lo com a antiga faca de correspondência do meu pai, admirar a obra, fotografá-la, pesquisar o artista, documentar tudo nas várias redes sociais que nos permitem alcançar e ser alcançados - por enquanto. Um dos trabalhos de que mais gostei até agora veio do Oregon: a artista pediu-me que retirasse a sua informação das redes, pelo que também aqui não partilho o seu maravilhoso website (se alguém estiver interessado que me escreva, por favor, por e-mail).
Os meu sonhos passaram a constituir-se de imagens únicas em catadupa, a consciência de mim mesma esbatendo-se face ao momento presente - como no ballet ou do que dele retenho da segunda infância. O tempo de estabelecer contactos e parcerias, vulgo promoção e produção, rouba-me, no entanto, espaço lá fora, com o vento, a ribeira, as plantas, os pássaros e as galinhas, como por dentro com leitura, colagem e escrita. Forço-me a largar os écrans e saio com a Areia, a cadela que é também sombra minha, para três passeios por dia. De vez em quando faço uma pausa no galinheiro. À noite converso com o meu amor com o som das nossas vozes na mesma dimensão, povoando mais ainda a minha conectividade eléctrica com o mundo e o planeta.
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