É Entrudo!

Muito tempo antes dos católicos terem atribuído a este dia a designação terça feira gorda, no culminar de alguns dias de descontrole e em alusão ao período de sobriedade e contenção em que consiste a quarentena santa que precede a Páscoa, e que amanhã, quarta-feira de cinzas, se inaugura (depois de queimado o entrudo chocalhudo, que representa o que é de mal numa das mais conhecidas tradições nacionais sobreviventes), já se celebravam estes dias de inauguração da fertilidade e simbólico enterro da escuridão, no espírito mais puramente pagão. Diz-se que é Carnaval, ninguém leva a mal, porque também de um espírito raro de ironia, [auto-]crítica e capacidade de rir de si próprio está imbuída esta época; podendo constituir escárnio, é sobretudo de um momento de pôr a nu o que tem estado escondido, como que em hibernação, que se trata. Em Portugal existem dezenas de tradições associadas à origem do termo, algumas delas de memória bem viva, outras um pouco contaminada por esse outro, mas grandioso, espírito de que se revestiu o Carnaval no Brasil. Mas todas a marcar passo com o ciclo da vida na Natureza.

Também assim resiste a alegria de viver, mesmo nos tempos que se crêem de morte: com renovada esperança na nossa presença inteira pela passagem do tempo, no assinalar atento de cada estação, mas sobretudo da Primavera, que é também a época da sementeira, promessa de luz, criatividade e abundância. É a própria Vida que se anuncia agora, ainda que talvez um pouco precocemente do ponto de vista da Europa central.

Libertação, espírito [auto-] crítico e vitalidade enquanto celebração colectiva da existência, parecem-me bons motivos para manter viva uma tradição, mesmo onde ela não tem grande expressão. 


Entrudo, Carnival, Fasching

Olhemo-nos e questionemo-nos então ao espelho com a ligeireza da liberdade, bem como aos que exercem poder, nos representam e à autoridade; se possível com a generosidade do riso sem reservas nem pudores, verdadeiramente embriagados na arte da reflexão e da emoção unidas, que [por meio de um exercício colectivo, num momento fugaz e parcialmente subconsciente, já urgente] nos transfiguram e fazem transcender.

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Let us look at us and question ourselves in the mirror then, with the lightness of freedom, as well as at those who exercise power, represent us and authority; if possible with the generosity of laughter, with neither reserve  nor shame, but truly intoxicated by the art of reflection and emotion united, which [by the means of a collective exercise, in a fleeting and partially subconscious moment, already urgent] 
transfigure us and make us transcend.


Entrudo, nome masculino (sing.)
1. dias de festejo anteriores à Quarta-Feira de Cinzas; Carnaval 


O termo Carnaval é ainda hoje objecto de discussão: para alguns estudiosos, surgindo do latim ‘carnevale', significará ‘adeus carne', anunciando assim que a Terça-Feira Gorda é o último dia do calendário cristão em que é permitido comer carne; outros defendem que, surgindo de ‘carnevalemen', o termo significará ‘o prazer da carne'; outros ainda sustentam que o termo deriva de ‘carrus navalis', fazendo referência às festas dionisíacas nas quais um carro, transportando um grande tonel, distribuía vinho aos foliões da Roma imperial.

Certo é que ao longo dos tempos o Entrudo (termo que terá origem em ‘introitus', significando ‘entrada') sempre foi caracterizado por uma certa permissividade, destacando-se as brincadeiras e a troça dirigida às autoridades, aos costumes e à moral vigente (...).


Festivity of the Entrudo: The carnival period that begins on January 6, Epiphany, is marked by various moments of community spirit leading up to the festivity of Fat Sunday and Carnival Tuesday, designated by the days of the "Compadres and Comadres" (the "godfathers and godmothers") - which are essentially preparatory celebrations for the principal days of fun and amusement.

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