Ervas Daninhas

A minha insubstituível vizinha, que diz que gostava de ter 25 horas por dia para fazer, exactamente, aquilo que faz, tinha prometido tratar das ervas daninhas ontem à tarde, isto depois de ter indagado da minha vontade de organizar de novo uma festa para o seu aniversário, em Junho, e de eu lhe ter respondido que bonito seria se ela recomeçasse a ajudar com o jardim… telefonou-me ao meio dia a dizer que, se eu não me despachasse em meia hora, teria que ir andando porque ia voar, ao que eu lhe disse para fazer o que pudesse, que eu faria o resto mais tarde. Ainda a vi pela janela a deixar o pátio, de olhos e mãos no telemóvel (ela não conhece outra forma de comunicar, incluindo tocar à campainha ou manter uma combinação verbal sem mais quês). Quando desci ao pátio para começar a sementeira, constatei o óbvio: não tinha feito nada. E, por isso, lancei-me eu às ervas.

Apesar do jardineiro nos ter ensinado a arte de arrancar as ditas, em oficina organizada por mim mesma, eu estava, na altura, demasiado ocupada a fotografar, filmar e gerir a comunicação com os vizinhos e os artistas com quem desenvolvemos o primeiro projecto comunitário neste jardim que vem vindo a crescer exponencialmente (estava em residência artística e não sobrava muito tempo para jardinagem propriamente dita). Nunca aprendi a fazer. Mas sabia a teoria: é uma questão de puxar a raíz sem deixar muito ar na terra, senão crescem mais ainda ou mais depressa, não sei ao certo, mas há é que calcar bem o espaço deixado vazio para não sobrar dano. Assim fiz, enquanto as costas mo permitiram, passando depois à mais prazerosa actividade de semear flores campestres, quer no prado de abelhinhas a meia luz, quer no que se encontra exposto a sol directo. Plantei também algumas sementes de girassol nas suas margens e de papoilas em volta dos canteiros de legumes e junto aos cactos (a ver se este ano pegam, o ano passado não deram em nada), bem como de alguns tipos de salada, nastúrcio e salsa. Cuidei da terra de vasos, vasinhos e canteiros, limpei o resto das folhas secas, varri os restos e reguei. De seguida, deliciei-me ao sol, ainda raro, a pintar os móveis com óleo de linhaça (a minha tarefa original).

Quando dei por mim, não tinha sentido a falta de música, pela primeira vez, nestes trabalhos. Ou de conversas. Ou sequer de fazer pausas e ir registando os actos, mas não deixei de tirar algumas fotografias para mostrar ao jardineiro e lhe colocar, eventualmente, algumas questões… e para minha própria satisfação, a título de desfecho e de dever cumprido. Coloquei ainda um quadro das produções artísticas do Verão passado num muro e, por fim, chamei o gato para casa, que estava tão abandonado a prazeres solitários como eu, fazia horas.

Depois, na cozinha, preparei um spaghetti com pesto, malagueta, queijo parmesão vegetariano, pinhões tostados e folhas de manjericão. Enchi um copo de vinho branco fresco e pus mais uma garrafa de tinto na mala para levar, descendo de novo as escadas. Arrisquei ir sem livro, música ou papel e caneta, e não me arrependi. As plantas, os movimentos dos pássaros, que também andavam por ali a comer, o som do ventinho que se pôs, o sabor da comida e do vinho e os meus pensamentos bastaram-me. Se isto não é vida no seu esplendor, não sei que seja. Senti-me renascer, como se quer num domingo de Páscoa.











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